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Intolerância religiosa

Maurício Pestana: Religião não se discute, se respeita!

Das lembranças que trago da infância, lembro-me das conexões religiosas bastante ecumênicas, mas também de muito respeito em um Brasil ingênuo de convivência harmoniosa do ponto de vista religioso, que não existe mais.

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Foto: CNN Brasil

Das lembranças que trago da infância, lembro-me das conexões religiosas bastante ecumênicas, mas também de muito respeito em um Brasil ingênuo de convivência harmoniosa do ponto de vista religioso, que não existe mais.

Lembro-me ainda que quando criança brincava com os meus primos Eliseu, Elias, Eneias, todos nomes bíblicos, impostos por pais cristãos fervorosos de uma corrente evangélica que proibia as mulheres de cortar o cabelo ou se depilarem e em que crianças e adultos jamais assistiam à televisão.

Esses rígidos dogmas só eram quebrados quando meus primos, escondidos dos pais, e com a anuência de minha mãe, católica fervorosa, mas sempre atenta aos ensinamentos de uma boa "benzedeira" e por complacência aos sobrinhos "crentes", deixavam os meninos assistirem com o resto das crianças à TV, que exibia séries infantis sobre outros mundos e outros deuses como “Perdidos no Espaço”.

De lá pra cá, muitas coisas mudaram… Os evangélicos hoje não só podem assistir à TV como até têm seus próprios canais. Atualmente, no Brasil, eles não são mais uma ínfima minoria, pelo contrário, existem projeções que, em breve, serão a maioria no país e já são providos de poderes econômicos e políticos, com bancada robusta no Congresso que tem até governadores e prefeitos, e muito poder midiático — aliás, maior do que qualquer outra religião no país.

Estão longe daquela minoria chamada de "os crentes" dos anos setenta da época da minha infância e portanto exigindo o devido respeito que lhes é devido. Porém, esse crescimento, também vem acompanhado de outros aumentos, o país que antes se vangloriava de ser o maior país católico do mundo, assiste aos poucos suas ovelhas se bandearem e engordarem outros rebanhos.

Outros credos religiosos crescem também em números e formação, inclusive, acadêmica. A "benzedeira" de ontem é a mestre e doutora macumbeira de hoje, que tem orgulho de sua religião e consciência de seus direitos, e exige também cada vez mais respeito e isto ultrapassa a barreira da cor.

É só lembrar que é exatamente de São Paulo em direção à região Sul, onde mais crescem as religiões. O Rio Grande do Sul é hoje o estado que tem o maior número de templos de religião de matriz africana registrados no país, superando inclusive a Bahia, tida como berço dessas religiões em solo brasileiro.

A intolerância se impõe hoje muito mais por conta da matriz africana do que pela cor da pele como ficou exposto em um fato que ganhou a imprensa esta semana, onde o professor doutor, pesquisador e babalaô (sacerdote do Culto de Ifá na religião iorubá) Ivanir dos Santos entrou com uma representação pública contra a cantora Ludmila, após a artista exibir, durante um show no Coachella um vídeo de uma pessoa pisando em uma oferenda, seguida da frase: "Só Jesus expulsa o tranca rua das pessoas".

O representante religioso exigiu que a cantora se manifestasse imediatamente (ela se manifestou nas redes sociais, negando a intolerância), sendo este o primeiro passo para um processo por discriminação religiosa.

Ludmila e Ivanir têm a mesma origem, são cariocas, pretos, cada um de sua forma lutam contra preconceitos, discriminação e o racismo, faltou a cantora entender que religião não se discute, também não se expõe depressivamente em shows. Religião apenas se respeita, principalmente quando essa religião é historicamente desrespeitada por ter origem preta e africana.

Fonte: CNN Brasil

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